Dia Mundial Sem Tabaco: Uma Aliança na Prevenção do Cancro do Pulmão

O tabagismo é uma das principais causas de doenças e mortes evitáveis no mundo, sendo responsável por milhões de óbitos todos os anos. A Organização Mundial da Saúde (OMS), e os seus parceiros, a cada 31 de maio, comemoram o Dia Mundial Sem Tabaco, destacando os riscos para a saúde associados ao uso do tabaco e defendendo políticas eficazes para reduzir o seu consumo.

O consumo de tabaco contém substâncias químicas que provocam cancro e outras doenças em diferentes órgãos do corpo, aumentando significativamente o risco de desenvolver estas doenças. Parar de fumar reduz consideravelmente a probabilidade de desenvolver vários tipos de cancro (ex: cancro do pulmão) e melhora a saúde em geral. No apelo do Diretor-Geral da OMS, Tedros Adhanom Ghebreyesus, este afirma: “Pedimos a todos os países que façam sua parte, aderindo à campanha da OMS e criando ambientes livres do tabaco que forneçam às pessoas as informações, o apoio e as ferramentas de que precisam para deixar de fumar para sempre”.

Completam-se agora dois anos desde que decorreu a 9th European Conference on Tobacco or Health (ECToH23) em Madrid, a maior conferência europeia dedicada especificamente ao tabaco e ao seu impacto na Saúde e na sociedade, à qual tive a honra de presidir como Presidente da European Cancer Leagues (ECL). Este evento teve como presidente honorária a Rainha Letizia de Espanha, que nos brindou com um excelente e assertivo discurso de abertura. A Cerimónia de Encerramento, momento nobre, ficou marcada pela assinatura da Declaração de Madrid/ Magna Carta Contra o Tabaco que foi aprovada por unanimidade por toda a assembleia (Tob Prev Cessat. 2023 Dec 18;9:38).

Nesta Declaração são apontadas diversas iniciativas decisivas para proteger a saúde dos nossos jovens e para criar uma geração livre de fumo até 2040, consciencializar sobre os riscos do tabagismo e promover políticas de prevenção com um particular destaque para a importância de proteger crianças e jovens da influência da indústria do tabaco, que utiliza redes sociais e plataformas de streaming para atrair novos consumidores.

Sabemos hoje que cerca de dois terços das causas de morte nos fumadores são atribuíveis ao consumo do tabaco e, em média, um fumador vive menos 10 anos do que um não fumador. O tabaco é o único fator de risco comum a quatro das principais doenças crónicas: cancro, doença respiratória crónica, diabetes e doenças cérebro-cardiovasculares.

E segundo a DGS estima-se ainda que, em 2019, tenham ocorrido, em Portugal, cerca de 13.500 óbitos atribuíveis ao tabaco incluindo 1.771 por exposição a fumo passivo. No caso do cancro do pulmão, este está associado em 85% dos casos ao fumo do cigarro. Em 2020, registaram-se 4.797 óbitos devido a este tipo de cancro, representando aproximadamente 15,4% das mortes por cancro no país sendo que a maioria dos casos (75%) é diagnosticada em estádios avançados, o que contribui para a baixa taxa de sobrevivência. De uma forma resumida, 15 portugueses são diagnosticados TODOS OS DIAS com CANCRO DO PULMÃO sendo que 13 MORREM TODOS OS DIAS com A DOENÇA.

Além do impacto social, o cancro do pulmão afeta física e emocionalmente os doentes, com um impacto considerável nas suas famílias. Estudos realizados com doentes com cancro do pulmão demonstram que 62% destes doentes evidenciam sofrimento psicológico. Por outro lado, o crescente impacto económico direto é significativo envolvendo 0,09% do PIB português, aproximando-se de 1% do total das despesas de saúde em Portugal (números de 2012 com tendência crescente).

O maior estudo europeu sobre o rastreio do cancro do pulmão, demonstrou um potencial de redução da mortalidade em 25% numa população de alto risco após rastreio (Cancer Imaging. 2011 Oct 3;11 Spec No A(1A):S79-84).

Em Portugal, a Aliança para o Cancro do Pulmão, adaptou localmente um modelo de aferição do custo-efetividade da implementação do rastreio da doença, demonstrando que a implementação do Programa de Rastreio é custo-efetiva para a realidade portuguesa. (J Comp Eff Res. 2024 Nov;13(11):e240102).

A Aliança para o Cancro do Pulmão é uma iniciativa nacional, inspirada na iniciativa internacional Lung Ambition Alliance. Em Portugal, esta Aliança é composta por membros de sete entidades, unidas pelo objetivo comum de reduzir a mortalidade, aumentar a sobrevivência e a qualidade de vida dos doentes com Cancro do Pulmão.

Qualquer estratégia de rastreio a ser implementada deverá ser acompanhada de medidas associadas a Educação/Literacia para a Saúde e Legislação complementar. De realçar a importância das organizações que estão no terreno com intervenção credível e direta na comunidade como é o caso da Liga Portuguesa Contra o Cancro que desde há muitos anos, utiliza “O Código Europeu contra o Cancro” indicando recomendações para a população que permitam reduzir o seu risco para o desenvolvimento de cancro com base nos resultados mais recentes da investigação científica.

Face a esta avassaladora evidencia, é premente a reflexão sobre as estratégias de intervenção e prevenção do cancro do pulmão. Relativamente a prevenção, todo o conhecimento científico indica que a intervenção combinada da Prevenção Primária (Educação, Legislação, Cessação tabágica) com a Prevenção Secundária (Rastreio) oferecem a melhor garantia de eficácia para a prevenção. Enquanto houver um doente com cancro do pulmão significa que falhamos na prevenção primaria e secundaria de 85% destes doentes, mas há 15 a 20 anos, o tempo médio de desenvolvimento de um tumor.

A prevenção do cancro pode ser equiparada a uma maratona e como tal os resultados têm um longo tempo de maturação. Mas resulta, e é a melhor forma de evitar um pesadelo.

 

Artigo redigido por Rui Medeiros, Investigador e Professor Universitário, Liga Portuguesa Contra o Cancro/ Aliança para o Cancro do Pulmão

Partilhe este artigo nas suas redes sociais:
Facebook
Twitter
LinkedIn
WhatsApp